segunda-feira, 15 de outubro de 2001

Etiqueta básica de como não se portar num concerto

Eu sei que ninguém nasce sabendo. Por isso escrevo, com base no que já presenciei, algumas dicas de como não se portar num concerto:
* Concerto no teatro é diferente de barzinho com som ambiente. Portanto, vá ao teatro para assistir à orquestra, não para pôr fofoca em dia. Os demais presentes no recinto provavelmente não estão interessados em saber que teu namorado te chifrou, ou que você está tendo problemas no serviço, muito menos nos teus comentários sobre a novela do SBT.
  * Se você não estiver gostando do concerto durma. Mas, por favor, não ronque, que incomoda. E não se deite no ombro de quem está ao seu lado se esse alguém não for teu conhecido. Ele pode não gostar.
* Se você não quer dormir, aproveite o intervalo entre duas músicas e educadamente peça licença e se retire.
* Se você costuma não gostar de orquestra, compre um lugar na extremidade da fileira, e não no centro. Assim é mais fácil sair sem incomodar os outros ou dar pontapés nas suas cabeças, ao pular o banco, quando se está sentado num dos andares.
* Se você se entediar e não quiser dormir nem puder sair, preste atenção na roupa dos outros presentes, você sempre encontra uns tipos bizarros, tais como: casais vestidos para baile de gala, um anormal de camiseta furada e manchada e calça por passar, uma guria de bota cano alto, mini-saia bem mini, enfim, uma típica moça da geração filhos da Xuxa; um piá se achando o enviado do demo por usar uma camiseta com o monstrinho do Iron Maiden, uma madame de casaco de pele (em plena Ribeirão!), e outros espécimes raros.
* Tossir é normal. Agora, se você tem acesso de tosse, desses escandalosos, que duram cinco minutos, compre um lugar no canto da fileira, e se retire quando um desses acessos vier.
* Faça um esforço e não coma bala durante a música. Quer dizer, comer bala não é o problema, o problema é o barulho – digamos, irritante – que se faz quando se está "desembrulhando" balas tipo Ice Kiss, ou chacoalhando o potinho de Tic-Tac. Use os intervalos para isso.
* Bocejar é normal, mas seja discreto. Boceje silencioso, evite os AAAAAAAAAAAAAAHHHHHHHHHHHH que costumam acompanhar os bocejos.
* Desligue seu celular. Não importa que a musiquinha que você pôs para tocar é a nona sinfonia de Beethoven, e que ela é melhor que a rapsódia do Liszt que está sendo executada. Quem foi ao teatro quer escutar a orquestra e não seu celular.
* (este é principalmente para as mulheres). Se você está com um sapato "barulhento", não queira trocar de lugar, ou mesmo sair, no meio de uma peça. A acústica do teatro é muito boa e o TOC TOC TOC pra lá, TOC TOC TOC pra cá incomoda a todos, o maestro e a solista, inclusive.
* Se você for em grupo ao concerto, não queira ser o palhaço da turma. Deixe suas piadas para depois, por mais esdrúxulo que seja o homem do oboé. É chato, no meio de uma marcha fúnebre, meia dúzia de bocós se estourarem de dar risada.
* Os lugares do teatro são marcados. Então, se você comprou um ingresso para a quarta fileira da galeria (que Érico Veríssimo carinhosamente chamava de galinheiro) não se sente na primeira fileira do balcão nobre. E não insista com o monitor e o dono do lugar que é tudo a mesma coisa. Não é. E se você realmente acha que sim, vá se sentar no lugar que você comprou. Se não acha, vá assim mesmo e pare de aglomerar.
* Uma importante dica: se você estava conversando e alguém pedir silêncio, cale a boca e não se zangue. Não comece a discutir e chamar para a briga. E tente ao máximo não partir para a ignorância. Ainda mais se você estiver sentado próximo ao palco: além do mico que você vai pagar, já que o teatro inteiro vai se voltar pro bafafá que você está arranjando, você ainda vai fazer com que parte da orquestra se desconcentre e se perca. Sem contar que você, que já não tinha razão, uma vez que estava conversando num loca não propício, vai passar a ter menos razão ainda depois de dar um soco no jovem que te pediu silêncio.
* Para os apaixonados: uns beijinhos tudo bem, mas procure evitar aqueles beijos "limpeza gastro-intestinal", em que tua língua some goela adentro do teu amor e voa baba pra tudo quanto é lado.
* Sente cada um numa poltrona. Pega mal os dois espremidos numa, ou ela no colo dele. Podem pensar besteira...
* Se você é conhecedor de música e gosta de "pegar" o ritmo dela, faça-o mentalmente. Não pegue o ritmo batendo o pé, estralando a língua, ou seja lá como for.
* Se você gosta e conhece a música, apenas aprecie-a. Não há necessidade de acompanhá-la assobiando ou "cantando".
* Se você gosta de matemática, conte quantos integrantes tem a orquestra em silêncio.
* Não dê cotovelada (é cotovelada mesmo, não toque com o cotovelo) no infeliz que está no seu lado para mostrar para ele que você sabe contar.
* Não de cotovelada no infeliz que está no seu lado para mostrar que você sabe ler, perguntando se ele sabe qual o instrumento toca o maestro – sendo que isso está escrito no programa do concerto, o qual todos têm.
* Não dê cotovelada no infeliz que está no seu lado para mostrar que você sabe o nome dos instrumentos. Principalmente se você não sabe.
* Por fim, teatro é um lugar tradicional. Não queira ser inovador. Ao terminar o concerto, apenas bata palmas. Não sei porque demônios certa noite um faceiro resolveu gritar "Bravo!". Um outro ignóbil que estava por lá, não querendo ficar pra trás gritou "Muito bom!". Um terceiro gostou e gritou "Parabéns!". E agora, a cada concerto, surge um novo idiota com uma nova frase. Já foi "Lindo!", "UHU!", "AEEE!" e um doente que proferiu um pequeno discurso. Falta ainda gritarem "Arriba muchachos!" e "GOOOOOOOOOOL!", mas não queira ser o primeiro. Aplaudir é o suficiente, sério.
Bem, os que conseguiram chegar até o fim dessa maçada devem estar se perguntado "e eu com isso?". É que sexta e sábado agora (dias 19 e 20) tem Orquestra Sinfônica no Teatro Pedro II.

Ribeirão Preto, 15 de outubro de 2001

2 comentários:

Carlos disse...

Muito boas as dicas Daniel. Algo que também é o 'máximo' é logo ao fim da execução do hino, todos baterem palmas...não há necessidade, pois não se está comemorando nada! É o hino minha gente, rs.

Daniel Gorte-Dalmoro disse...

Pqp, como eu era chato! Ainda bem que não sou mais taaanto assim.