Você está aqui: Página Inicial / Rede / Temporada de Projetos na Temporada de Projetos / arquivo / Arte-projeto / Tadeu Chiarelli: O projeto como projeto/o projeto como arte: considerações sobre arte e curadoria

Tadeu Chiarelli: O projeto como projeto/o projeto como arte: considerações sobre arte e curadoria

por Lucas Oliveira

encontro com Tadeu Chiarelli











O encontro com o professor Tadeu Chiarelli, coordenador do Departamento de Artes Plásticas da Escola de Comunicação e Artes da USP, pesquisador e curador, que aconteceu no ciclo de palestras “Arte-Projeto” da Temporada de Projetos na Temporada de Projetos, teve como tema central as suas reflexões acerca da atividade curatorial, das suas relações mercadológicas e de suas implicâncias na academia. Baseando-se na sua experiência como curador, como pesquisador, professor e orientador de um grupo de estudos de crítica de arte, Tadeu falou de algum desapontamento e desmotivação sua com a atenção despreocupada que a atividade recebe no Brasil e no exterior.

Segundo ele, sua desmotivação se deve a um esvaziamento da atividade. A curadoria e os processos curatoriais deveriam ser decorrentes de uma prática de pesquisa; ser subsidiárias da história e da crítica. O curador ganhou espaço no exterior, há alguns anos, e isso agora acontece no Brasil, o que gera uma movimentação no sentido de criar profissionais especializados para exercer essa função. Como exemplo, Tadeu mencionou que, certa vez, houve um projeto para criar um curso de especialização em curadoria na USP, e que, assim como outros colegas, ele se contrapôs à proposta. Para ele, essa demanda por curadoria é uma demanda de ordem mercadológica, que uma universidade pública, que não possui sequer um curso de graduação em história da arte, não deveria priorizar. Este testemunho acusa a fragilidade do espaço das humanidades na universidade.

Os cursos de curadoria tentariam abranger conhecimentos em história, crítica, colecionismo, expografia, entre outros de cunho técnico. Essa formação atenderia  a um fluxo de mercado, a uma demanda por eventos (exposições),  que transformam o curador em um agenciador de artistas, criador de exposições desvinculadas de interesses e pesquisas anteriores; superficiais, por conseguinte. As exposições, neste contexto, servem como recurso descartável de preenchimento dos espaços expositivos. Segundo Tadeu, as obras de arte seriam “conclamadas a fazer andar a fila de eventos artísticos”. Para ele, a curadoria deveria estar ligada a um projeto pedagógico e a um discurso artístico. Tadeu reconheceu, contudo, que a origem da sua fala parte de preceitos acadêmicos e que isso acarreta algumas limitações.

Comentando a sua relação com obras e artistas que apresenta em suas exposições, ele mencionou que algum contato anterior, seja em ateliê ou em outra exposição, pode ser decisivo.

“Quando uma obra me toca, me surpreende ou me emociona, ela me obriga a repensar todos os meus conceitos de história da arte, no sentido de reorganizar o conhecimento para poder integrá-la e proporcionar a plataforma para debate”, afirmou. Isso, contudo, não exclui os projetos processuais da sua seleção.

A curadoria faz uso das obras como instrumentalização de um discurso, de ordem artística, cultural ou ideológica. Se a arte possui uma dimensão cultural, e o curador é um espectador especializado, revelador de seus valores, ele deve, então, expor o trabalho como recurso discursivo e apresentar, de variadas formas, a própria leitura da obra e criar um conjunto coerente que evidencie, nas exposições, questões de autoria e de autoridade discursiva. Ao comentar a sua experiência como aluno do professor Walter Zanini, Tadeu mencionou que ele sempre dizia que a obra de arte deve estar em primeiro lugar em uma exposição, seguida do artista e, depois, de todo o resto. “Todo o resto” seria, para ele, o lugar indicado para a curadoria.

Quando questionado sobre a relação do curador com os artistas, Tadeu retomou a discussão sobre a curadoria de obras processuais, que, para ele, acontece de forma colaborativa entre artista e curador, para que a obra não se transforme em algo acabado. É importante, segundo Tadeu, que o curador pense a exposição de forma que a obra possa ser respeitada e exposta de forma íntegra, porque a expografia, o texto curatorial, tudo, interfere na leitura que se tem da obra.

Em resposta a outra pergunta, sobre a elaboração de projetos em artes e os critérios de julgamento  e avaliação da pesquisa em artes, Tadeu levantou a discussão sobre a importância da pesquisa na área, ainda que a academia não lhe dê a devida importância, dado que uma exposição tem, por exemplo, um valor menor do que um artigo em outras áreas. Ainda sobre o problema das artes na Universidade, foi comentada a situação do MAC (Museu de Arte contemporânea), que possui um acervo considerável, do qual uma parte já pertenceu ao MAM (Museu de Arte Moderna), e que está sendo deslocado para o prédio do DETRAN, na região do Ibirapuera, e abandonando o campus da USP. Para Tadeu, isso é a máxima demonstração do descaso que da USP com os seus museus, o que já era bastante perceptível pelas condições do MAE (Museu de Arqueologia e Etnologia) e pelo Museu de Zoologia. Isso também se reflete na formação em artes, que é deficiente, o que é também uma irresponsabilidade das pessoas da área.

Sobre a relação da curadoria com o educativo, que acompanha o trajeto da exposição, Tadeu comentou uma evolução nas próprias concepções a respeito das práticas educativas em museus. É necessário que o curador esteja em contato com o setor educativo, antes e durante a exposição, para retirar informações oriundas da proximidade que o educativo tem do público. Esta necessidade é um fator que aponta uma qualidade dialógica, com o público e com artistas e curadoria, que cabe ao educador.

Finalmente, ao comentar a relação da curadoria com o projeto do artista, foi apontada a diferença  que se tem quando o projeto traz consigo a força de um trabalho plástico e a força e uma idéia. Em alguns casos, o trabalho pouco importa, porque é a idéia que gera um fascínio. Vale lembrar que o palestrante tentou partir, a todo momento, de opiniões derivadas da própria experiência de contato com artistas, de professor e curador.

 


O encontro ocorreu no dia 04/11/2009, sábado, às 15h, no Paço das Artes, como parte do programa "Arte-projeto" da curadoria "Temporada de Projetos na Temporada de Projetos"