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Cristiana Tejo: Como curar o outro?

por Jaime Lauriano


    

     A conversa com Cristiana Tejo aconteceu dentro do módulo “Arte-Projeto”, ciclo de encontros com críticos, artistas e curadores que relatam as suas experiências com editais públicos e privados, e debatem o modelo de exposição adotado pelos curadores Luiza Proença e Roberto Winter para a exposição "Temporada de Projetos na Temporada de Projetos”, no Paço das Artes em São Paulo.

    Com vasta experiência em comissões de seleção, Cristiana Tejo abriu a sua fala ressaltando a importância da posição adotada por Luiza e Roberto, que ao seu ver auxiliam na desmitificação do sistema de arte brasileiro, pois fazem uso de sua curadoria não só para mostrar os projetos inscritos no edital de seleção do Paço das Artes, mas também para abrir um canal de diálogo entre todas as instâncias desse sistema. Tejo ressalta também que para realizar uma seleção através de portifólios a comissão de seleção estabelece critérios que não anulam a subjetividade.

    Para mostrar um outro exemplo de seleção Cristiana Tejo contou a sua experiência como integrante da comissão de curadoria da edição de 2004/2006 do programa Rumos Artes Visuais, do Instituto Itaú Cultural, que nesta edição retomou o seu mapeamento nacional. As viagens para mapear a produção daquele período fizeram com que Tejo saísse mais de Recife e entrasse diretamente em contato com o contexto de outros artistas. Os choques de contextos provenientes dessas viagens fizeram Cristiana Tejo descobrir as particularidades do Recife e com isso enxergar a pluralidade do Brasil, e questionar até que ponto a sua visão poderia ser realmente diferente de um outro curador de um grande centro urbano brasileiro. Hoje, passados quatros anos dessa experiência, ela entende que as visões se assemelhariam, pois ambos são formados e trabalham com arte contemporânea. 

    Voltando para o contexto de Recife, Cristiana Tejo falou da sua chegada à instituição como coordenadora da Fundação Joaquim Nabuco. Tejo contou que percebeu que mesmo passando pelo  conflito de "ser de esquerda" e dirigir uma instituição, esse seria o único caminho para continuar trabalhando com arte em Recife, e também que somente estando dentro da instituição poderia entendê-la melhor e, assim, contribuir para a sua transformação. Cristiana Tejo ressaltou também a importância das instituições na formação do público de arte contemporânea, pois ela se apaixonou e começou a se interessar por arte contemporânea ao ver um trabalho da artista Oriana Duarte na inauguração do Museu de Arte Moderna Aloísio Magalhães (MAMAM). Por isso ressaltou que não pode ser contra a instituição, pois a mesma tem a função de dar acessibilidade à produção dos artistas.

    Cristiana Tejo atentou também para a mudança de tratamento que o Recife começou a receber no cenário de arte no Brasil, pois nos últimos anos passou de receptor para exportador de massa crítica e de modelos de gestão de instituições. Um grande exemplo disso é a escolha do Moacir dos Anjos – curador e crítico de arte de Recife – para ser o curador da próxima Bienal de São Paulo. Isso resulta do processo de profissionalização do sistema de arte de Recife, e também de sua interligação com os grandes centros.

    Questionada sobre o sentimento comum que paira sobre o cenário de arte contemporânea de que tudo já está construído e sedimentado e que, mesmo quando há a vontade de se promover a mudança, as barreiras são infinitas. Tejo apontou que ao contrário do que possa parecer, tudo ainda está por ser feito, ou seja, que já superamos o paradigma moderno da destruição, e que por isso devemos construir sabendo que muito já foi feito. Na sua opinião, devemos resignificar as instituições a partir do contexto atual.

    Para quem as instituições e a arte contemporânea são visíveis?  Como se posicionar perante a  dança das cadeiras do poder? São algumas questões que a fala da Cristiana Tejo deixa no ar, para que continuemos pensando e tentando compreender o sistema em que estamos inseridos.


O encontro ocorreu no dia 03/12/2009, quinta-feira, às 15h, no Paço das Artes, como parte do programa "Arte-projeto" da curadoria "Temporada de Projetos na Temporada de Projetos"